Mattia tem uma irmã gêmea deficiente e com ela divide todo o seu referencial afetivo, como: a escola, os amigos, os pais e os professores. A sua responsabilidade e maturidade emocional passam pela experiência constrangedora de se ver deficiente, problemático e confuso aos olhos de uma comunidade de normais. Este referencial traz para ele um silêncio profundo, denso, com implicações sociais e afetivas. O desejo infantil de se livrar deste pesado estigma neurológico faz com que ele se perca da irmã e de si mesmo.
Alice é uma criança linda e cheia de vida, mas, após um acidente com esquis fica com sequelas em uma das pernas e passa a mancar. Esta particularidade a fragiliza diante do seu grupo de garotas poderosas da escola. Ela destoa do grupo na forma de andar, de vestir, de namorar e estas diferenças afloram a ira das demais, afinal ser bonita e poderosa é condição para a supremacia dos “bons” e o status deve ser preservado. Mas, uma das meninas deste grupo consegue vislumbrar esta dissonante fragilidade e revertê-la em singularidade. Alice se apaixona por ela. Mas novas ameaças ao precário mundo afetivo juvenil estão por vir e as defesas se preparam para afastá-las. É nesse diálogo com os “ bons” que a confiança de Alice é violada pela sua amada que a humilha diante de todos mostrando que o seu lugar não é junto delas.
Alice se encontra com Mattia neste mergulho singular. Cada um vivendo o silêncio imposto pela constelação afetivo-social. Passam os anos e eles encontram cada vez mais motivos para silenciarem seus medos e inseguranças, mas suas experiências e particularidades os aproximam sem que eles se percebam disto.
A plasticidade deste filme é belíssima! Personagens infantis, fotografias iconográficas traduzem a densidade das emoções.
Cenas como: Um lobo mau (personagem de uma história infantil) avisa logo no início do filme sobre os pensamentos ardilosos que nos assaltam e nos comprometem. Ou, a cena da confissão de Mattia. Quando ele se revela para Alice ao som (fundo) do helicóptero que sobrevoa a neve para o resgate da mesma (por ocasião do acidente na neve).
Os cortes na pele (de ambos) deixando- se ver. O corpo de ambos (magro ou gordo) na direção dos seus sentimentos.
É um silêncio ensurdecedor!
Bianca Siqueira
Bianca, parabéns pelo texto. Gostei bastante, pois ele traduz de uma maneira singular e sensível suas impressões a respeito do filme. Quando assisti A SOLIDÃO DOS NÚMEROS PRIMOS, não gostei muito, devo dizer, Mas suas palavras e a paixão de nossa amiga Carol pelo filme convidam à urgente revisão.
Abraços
Marcelo, foi a paixão de Carol por este filme que me convidou a assisti-lo … AGRADECIDA por isto.
bj
Ficou incrível mesmo o texto Bianca, mais do que tudo visceral.
Tô achando que devo divulgar mais minhas paixões pra que vocês se motivem a escrever esses textos incríveis!rs
Obrigada Bianca
bjs